Review | Baby Steps – Frustrante e divertido na mesma proporção

Poucos jogos conseguem transformar o simples ato de andar em uma verdadeira epopeia. Mas Baby Steps faz exatamente isso — e com muito estilo. Criado por Bennett Foddy (sim, o mesmo de Getting Over It) ao lado de Maxi Boch e Gabe Cuzzillo (Ape Out), e publicado pela sempre Devolver Digital, Baby Steps é mais do que um jogo: é uma piada prática de longa duração, um estudo sobre a paciência e uma aventura que, contra todas as expectativas, acaba sendo cheia de alma.

E com uma perna na frente da outra (literalmente), eu te conto por que Baby Steps é uma das experiências mais bizarras e surpreendentes de 2025.

Baby Steps é uma sátira absurda — mas surpreendentemente comovente — sobre amadurecer, enfrentar a vida e sair da inércia. Você controla Nate, um homem de 35 anos sem rumo, que vive no porão dos pais, cercado por lixo, anime e arrependimentos. Imaturo, escatológico, preguiçoso e irritante, Nate está longe de ser um herói. Quando uma intervenção familiar parece prestes a acontecer, ele é subitamente sugado para um mundo estranho e selvagem — e precisa, literalmente, aprender a andar novamente.

A metáfora é clara: cada passo trôpego é um reflexo da luta interna de Nate (e talvez da nossa também) para sair do lugar. É uma história contada com poucos diálogos e muitas quedas, mas que funciona. De forma inesperada, é fácil se identificar com Nate — principalmente quando tropeçamos repetidamente tentando encontrar direção, tanto no jogo quanto na vida.

O humor de Baby Steps é tão esquisito quanto seu protagonista. É escrachado, sem filtro, com piadas de xixi, vômito, flatulência, voyeurismo e fracasso. Mas, de algum jeito, tudo isso funciona — especialmente se você embarcar de cabeça na proposta absurda e não se levar tão a sério.

Os diálogos, quando surgem, são hilários e bem escritos, com um ritmo cômico afiado. Personagens bizarros cruzam seu caminho, como um misterioso homem australiano que aparece nos momentos mais improváveis, sempre com um comentário esquisito na ponta da língua. Nada nesse mundo é normal — e é exatamente isso que torna tudo tão memorável.

Esqueça tudo o que você sabe sobre “mover o personagem com o analógico”. Em Baby Steps, andar é um desafio literal: cada perna de Nate é controlada individualmente — L2 move a esquerda, R2 move a direita, e o analógico serve para inclinar o corpo. É como ensinar um bebê a andar… só que esse bebê tem 35 anos, vive no porão dos pais e carrega uma dose generosa de vergonha alheia.

Você vai cair. Muito. Vai escorregar em barrancos, rolar ladeira abaixo, perder minutos de progresso por causa de um único passo mal calculado. Mas é aí que está a mágica: o jogo te força a prestar atenção no terreno, no peso do corpo, no tempo dos movimentos. Cada passo vira uma pequena conquista. Cada tombo, uma lição — ou, no mínimo, uma boa gargalhada.

Diferente de Getting Over It, onde o fracasso muitas vezes é cruel, aqui ele também pode ser revelador. Às vezes, cair te leva a um atalho. Outras vezes, só te joga numa situação ridícula — mas sempre divertida. O jogo não te pune por errar. Ele celebra o erro, se alimenta do absurdo, e convida você a rir junto.

Num mundo cheio de jogos que te dão controle total, Baby Steps faz justamente o oposto: te tira o controle, te empurra morro abaixo e ainda ri da sua tentativa de se equilibrar. E de algum jeito, isso vira uma experiência divertida, cativante e até libertadora.

É frustrante? Com certeza. É estranho? Sem dúvida. Mas também é hilário, carismático e absurdamente humano. E talvez, no fim das contas, seja justamente isso que a gente esteja precisando: um jogo que nos ensine, devagar e sempre, a dar nossos próprios baby steps.

Baby Steps não é pra todo mundo. Se você gosta de progresso rápido, combates frenéticos ou objetivos bem definidos, talvez desista antes mesmo de passar da primeira colina. O humor também é extremamente específico — e por vezes desconfortável.

Baby Steps é, tecnicamente, um jogo de mundo aberto. O mapa é vasto, montanhoso, melancólico e cheio de obstáculos naturais. É um mundo contemplativo, onde o simples ato de subir uma colina pode levar vários minutos e exigir toda sua concentração.

À medida que você aprende a caminhar melhor, novas áreas vão se abrindo. Há trilhas escondidas, ruínas abandonadas, colinas traiçoeiras e até colecionáveis curiosos — como chapéus em locais inacessíveis que só podem ser alcançados com muita paciência e coordenação.

A exploração aqui não é sobre velocidade. É sobre perseverança. E quando você finalmente chega ao topo de uma montanha, a vista — e o sentimento de conquista — fazem tudo valer a pena.

Embora não exista um sistema tradicional de missões secundárias, o mundo de Baby Steps está repleto de objetivos escondidos. Seja alcançar um item num ponto alto do mapa, descobrir um atalho ou apenas interagir com objetos bizarros, há sempre algo novo esperando para ser tropeçado (literalmente).

Graficamente, Baby Steps aposta em um estilo semi-realista, com um mundo propositalmente desbotado e melancólico, refletindo o estado mental do protagonista. As animações são absurdamente desengonçadas — o que casa perfeitamente com o tom do jogo.

Os detalhes são sutis, mas eficazes. A física corporal de Nate é o verdadeiro protagonista aqui. Cada tropeço, escorregada ou desequilíbrio é simulado com uma fidelidade cômica que arranca risos até nos momentos de maior frustração.

O desempenho é sólido, mesmo em situações mais caóticas. Não há travamentos, mesmo quando você despenca de um penhasco ou tenta equilibrar Nate em uma pedra molhada. É tudo muito bem executado, considerando o caos que o jogo se propõe a entregar.

Agradecimentos a Devolver Digital que nos enviou o jogo para a produção do review!

Conclusão

Baby Steps é um jogo estranho, hilário, frustrante e surpreendentemente sincero. Uma sátira sobre amadurecimento disfarçada de simulador de caminhada com física quebrada, ele testa a paciência do jogador, mas também recompensa com momentos genuínos de diversão e reflexão. Pode não ser para todos, mas para quem se deixar levar, será uma caminhada inesquecível.

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